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16 dezembro 2009

A Última Estação, de Jay Parini

“Tentou localizar o seu costumeiro medo da morte e não conseguiu. Onde estava a morte? (…) Não sentiu medo algum, porque a morte não existia.” (p. 397)

A Última Estação Jay Parini

Hoje, pelo final da tarde, finalizei a leitura do segundo livro da minha lista de férias: A Última Estação (The Last Station, 1991), escrito pelo norte-americano Jay Parini. Recorrendo aos diários de Tolstói, de sua família e de seus amigos, Parini remonta, na forma de romance, os últimos e conturbados acontecimentos na vida do célebre escritor russo.

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Sinopse: O ano é 1910. Liev Tolstói é o escritor mais famoso de toda a Rússia e um dos mais lidos em todo o mundo. Mas, quase a chegar aos 82 anos, o autor de “Guerra e Paz” almeja apenas um pouco de sossego, longe dos repórteres e fotógrafos e dos conflitos no lar. Baseado nos diários daqueles que integraram o seu círculo mais próximo e também no legado do próprio Tolstói, este livro recria o último ano da vida do grande vulto das letras russas até aos derradeiros momentos que se seguem à sua dramática e desesperada fuga de casa, em outubro de 1910.

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Aclamado pela crítica e pelo público (elogiado inclusive por Gore Vidal como “um dos melhores romances históricos escritos nos últimos vinte anos”), A Última Estação ganhou recentemente uma adaptação aos cinemas, estrelada por Paul Giamatti (A Dama na Água) e Helen Mirren (A Rainha). Além disso, venceu o prêmio George Washington Kidd Award e foi editado em mais de 20 países.

Deve-se admitir: o livro merece essa pompa toda. Jay Parini reconta, com uma grande fidelidade aos fatos e com uma notável força narrativa, um dos mais intrigantes e surpreendentes episódios da vida literária: Liev Tolstói, de Janeiro de 1910 a Dezembro do mesmo ano, sofreu uma pressão psicológica fortíssima, proveniente de todos os lados – de sua irascível e implacável esposa, Sofia; de seu discípulo mais devoto e exigente, Tchertkov; de seu frágil estado de saúde; dos controversos filhos, Tânia, Sacha e Andrei, e de todas as outras pessoas que esperavam dele mais do que um homem aos 82 anos pode fornecer.

O livro prende tanto a atenção do leitor que, por incrível que pareça, consegui ler em um único dia nada menos que 185 páginas, o que é o meu recorde atual. Normalmente sou uma pessoa que lê 60, 70 páginas (no máximo) em um mesmo dia.

A intriga fundamental de A Última Estação é a seguinte: com a notável chegada de Tolstói aos seus últimos dias de vida, Sofia Andreiêvna, esposa do escritor, quer assegurar-se de que terá, para ela e para os filhos, todos os direitos autorais do marido, o que garantirá a vida econômica da família para sempre (para se ter uma idéia do que está em jogo: uma poderosa editora da época ofereceu a quantia de um milhão de rublos pelos direitos literários de Tolstói. Um milhão de rublos é mais do que podemos imaginar.) Sofia sente que merece tal recompensa do marido porque, nos seus primeiros anos de casados, era ela a pessoa que dedicadamente ajudava Tolstói a transcrever e a alterar seus manuscritos de, por exemplo, Guerra e Paz.

Mas Sofia Andreiêvna não está lutando à toa. Também com a intenção de pôr a mão no testamento de Tolstói está o dedicado e controverso discípulo Tchertkov, que alega que o maior gesto que o escritor poderá fazer para a humanidade é o de colocar todos os seus livros ao alcance do povo, transformando-os em total domínio público; e, conseqüentemente, não deixando um vintém para a esposa e para os filhos. Naturalmente, com este rumo de acontecimentos, Tchertkov sairá ganhando: terá a oportunidade de reeditar as obras do famoso escritor russo a seu bel-prazer.

Uma das características marcantes do livro é a narrativa polifônica, em que as várias personagens narram as suas impressões em capítulos diferentes, numa espécie de diário, fazendo o leitor oscilar entre aceitar os seus motivos particulares ou não. Essa é, mais ou menos, a mesma técnica utilizada em clássicos como Drácula, de Bram Stoker, e Frankstein, de Mary Shelley.

Em suma, A Última Estação fornece um entretenimento garantido e empolgante, além de encerrar uma série de informações valiosas sobre os derradeiros momentos de Liev Tolstói.

Especialmente recomendado aos fãs de romances históricos.

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Abaixo, dois dos trechos que achei mais interessantes.

“A maioria dos dias lembra outros dias. Vão-se enfileirando, ceifados pelo tempo. Não se lamenta muito sua perda. Mas alguns dias gloriosos se destacam na memória, dias em que cada momento brilha isoladamente, como seixos numa praia. Anseia-se para tornar a possuí-los e se lamenta a sua distância.” (p. 63)

“Em minha adolescência fui atraído para imagens e pensamentos indecentes. Percebo, agora, que a questão da decência é fictícia. É decente o tsar forçar jovens russos a matar jovens de outros países, das maneiras mais brutais? É decente a sociedade permitir que as pessoas morram de fome nas ruas, morram sozinhas, em miseráveis isbás, que vivam como ratos (…)? Mas a atividade sexual, a forma como homens e mulheres decidem combinar suas partes físicas, é completamente neutra. É, simplesmente, a energia empregada nisso – o tempo roubado do trabalho mental e espiritual adequado – que a torna vil.” (p. 121)

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PARINI, Jay. A Última Estação. Rio de Janeiro / São Paulo: Record. (1991)

Postado ao som de: Heat of the Moment, by Asia

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